16 de maio de 2012
FOLHA DE SÃO PAULO
Domingo, 02/08/2009
NEOPAGANISMO EVANGÉLICO
Teologia pentecostal se afasta da tradição judaico-cristã ao atribuir
ao mal uma potência independente de Deus e dos homens
JOSÉ ARTHUR GIANNOTTI
Colunista da Folha
Estava passeando pela TV quando dei com um culto da Igreja Mundial do
Poder de Deus. Teria rapidamente mudado de canal se não tivesse
acabado de ler o interessante livro de Ronaldo de Almeida, "A Igreja
Universal e seus Demônios – Um Estudo Etnográfico" [ed. Terceiro Nome,
152 págs., R$ 28], que me abriu os olhos para o lado especificamente
religioso dos movimentos pentecostais. Até então, via neles sobretudo
superstição, ignorando o sentido transcendente dessas práticas
religiosas.
No culto da TV, o pastor simplesmente anunciou que, dado o aumento das
despesas da igreja, no próximo mês, o dízimo subia de 10% para 20%. Em
seguida, começou a interpelar os crentes para ver quem iria doar R$
1.000, R$ 500 e assim foi descendo até chegar a R$ 1.
Notável é que o dízimo não era pensado como doação, mas simplesmente
como devolução: já que Deus neste mês dera-lhe tanto, cabia ao fiel
devolver uma parte para que a igreja continuasse no seu trabalho
mediador. Em suma, doar era uma questão de justiça entre o fiel e
Deus.
Em vez de o salário ser considerado como retribuição ao trabalho, o é
tão só como dádiva divina, troca fora do mercado, como se operasse
numa sociedade sem classes. Isso marca uma diferença com os antigos
movimentos protestantes, em particular o calvinismo, para os quais o
trabalho é dever e a riqueza, manifestação benfazeja do bom
cumprimento da norma moral.
Se o salário é dádiva, precisa ser recompensado. Não segundo a máxima
franciscana "é dando que se recebe", pois não se processa como ato de
amor pelo outro. No fundo vale o princípio: "Recebes porque doastes".
E como esse investimento nem sempre dá bons resultados, parece-me
natural que o crente mude de igreja, como nós procuramos um banco mais
rentável para nossos investimentos.
O crente doa apostando na fidelidade de Deus. Os dísticos gravados nos
carros, "Deus é fiel", não o confirmam? Mas Dele espera-se
reciprocidade, graças à mediação da igreja, cada vez mais eficaz
conforme se torna mais rica. Deus é pensado à imagem e semelhança da
igreja, cujo capital lança uma ponte entre Ele e o fiador.
ANTICALVINISMO
Além de negar a tradicional concepção calvinista e protestante do
trabalho, esse novo crente não mantém com a igreja e seus pares uma
relação amorosa, não faz do amor o peso de sua existência.
Sua adesão não implica conversão, total transformação do sentido de
seu ser; apenas assina um contrato integral que lhe traz paz de
espírito e confiança no futuro. Em vez da conversão, mera negociação.
Essa religião não parece se coadunar, então, com as necessidades de
uma massa trabalhadora, cujos empregos são aleatórios e precários?
Outro momento importante do livro é a crítica da Igreja Universal ao
candomblé, tomado como fonte do mal. Essa crítica não possui apenas
dimensões política e econômica, assume função religiosa, pois dá
sentido ao pecado praticado pelo crente. O pecado nasce porque o fiel
se afasta de Deus e, aproximando-se de uma divindade afro-brasileira,
foge do circuito da dádiva. Configura fraqueza pessoal, infidelidade a
Deus e à igreja.
Nada mais tem a ver com a ideia judaico-cristã do pecado original. Não
se resolve naquela mácula, naquela ofensa, que somente poderia ser
lavada pela graça de Deus e pela morte de Jesus, mas sempre requerendo
a anuência do pecador.
Se resulta de uma fraqueza, desaparece quando o crente se fortalece,
graças ao trabalho de purificação exercido pelo sacerdote. O fiel
fraquejou na sua fidelidade, cedeu ao Diabo cheio de artimanhas e
precisa de um mediador que, em nome de Deus, combata o Demônio. O
exorcismo é descarrego, batalha entre duas potências que termina com a
vitória do bem e a purificação do fiel.
PAGANISMO
Compreende-se, então, a função social do combate ao candomblé: traduz
um antigo ritual cristão numa linguagem pagã. Os pastores dão pouca
importância ao conhecimento das Escrituras, servem-se delas como
relicário de exemplos. Importa-lhes mostrar que o Diabo, embora tenha
sido criado por Deus, depois de sua queda se levanta como potência
contra Deus e, para cumprir essa missão, trata de fazer o mal aos
seres humanos.
O mal nasce do mal, ao contrário do ensinamento judeu-cristão que o
localiza nas fissuras do livre-arbítrio. Adão e Eva são expulsos do
Paraíso porque comeram o fruto da Árvore do Conhecimento do Bem e do
Mal e assim se tornam pecadores, porque agora são capazes de
discriminar os termos dessa bipolaridade moral.
Essa teologia pentecostal se aproxima, então, do maniqueísmo. Como
sabemos, o sacerdote persa Mani (também conhecido por Maniqueu), ativo
no século 3º, pregava a existência de duas divindades igualmente
poderosas, a benigna e a maligna. Isso porque o mal somente poderia
ter origem no mal. A nova teologia pentecostal empresta o mesmo valor
aos dois princípios e, assim, ressuscita a heresia maniqueísta,
misturando o cristianismo com a teologia pagã.
Pastor Silas Malafaia afirma que pastores que não pregam a Teologia da Prosperidade são idiotas e que deveriam perder a credencialEm entrevista a Revista Igreja de novembro de 2010 o pastor Silas Malafaia, da Igreja e programa de TV Vitória em Cristo, chamou os pastores que não pregam a teologia de prosperidade de Idiotas que deveriam perder a credencial e voltar a ser membro para aprender as Escrituras. Confira abaixo: Revista Igreja: O senhor está sendo duramente criticado pelo setor mais conservador da igreja por causa da teologia da prosperidade pregada por alguns convidados de seu programa, como Morris Cerrullo e Mike Murdock. Como o senhor responde a estas criticas de que a teologia da prosperidade não tem base bíblica e é uma heresia? Silas Malafaia: Primeiro quem fala isto é um idiota! Desculpe a expressão, mas comigo não tem colher de chá! Por que quando é membro eu quebro um galho, mas pastor não: é um idiota. Deveria até mesmo entregar a credencial e voltar a ser membro e aprender. Para começar não sabe nada de teologia, muito menos de prosperidade. Existe uma confusão e um radicalismo, e todo radicalismo não presta. Em seguida o pastor da Igreja Vitória em Cristo defendeu a Teologia da Prosperidade e a si mesmo: “Finanças é um dos maiores assuntos da Bíblia. Quando chega nesta parte, muitos pastores, as vezes porque eles mesmos não dão dízimo e nem oferta e, portanto não tem autoridade para falar do assunto, querem bater em quem fala”. O comentário gerou uma intensa polêmica na internet. O Pastor Sênior da Igreja Bíblica Cristã de São Gonçalo – RJ, Alan Capriles, citou a tradução da Bíblia na linguagem de hoje, onde relata que Jesus disse “E quem chamar o seu irmão de idiota estará em perigo de ir para o fogo do inferno”, Mateus 5:22. O curitibano Clauber Ramos falou sobre a nova polêmica: “Uma coisa engraçada dessa gente da prosperidade é que nenhum deles nos pedem para semear nosso dinheiro em obras de caridade, em ajudar meus vizinhos necessitados, em ajudar ONGs que fazem um bom trabalho comunitário, etc. A “benção” só é válida se eu semear no campo deles, coisa estranha isso” e completou: “Deus não olha minha oferta (seja em dinheiro ou não), Ele olha o meu coração, isto é muito claro na Bíblia. Ele vai olhar a minha generosidade, o meu amor pelo próximo, o quanto eu me compadeço com o sofrimento do outro… Ai sim creio que Deus tenha prazer em retribuir, mesmo que eu não mereça esta retribuição”. O blogueiro e pastor Danilo Fernandes publicou em seu blog sua opinião sobre a afirmação de Silas Malafaia: “Eu só tenho uma pergunta a fazer a este deus da prosperidade: O que Malafaia, Cerrullo e Murdock têm que Jeremias, Jonas e João Batista não tinham para, em sendo igualmente profetas, tendo dado tudo de si, terem vivido em indesejável pobreza e grande perseguição, enquanto os novos profetas, fazendo tão menos, vivem como nababos? Foi falta de fé dos profetas antigos ou eles não pagavam o dizimo?” e alfineta: “Mas Malafaia é sincero quando chama seus críticos de idiotas. Pela sua justificativa que coloca os contrários à sua tese da vida cristã financeira na vala do pobrismo, ele há de achar que fala com idiotas!”. Danilo ainda conclui: “Não há nada contra ter dinheiro. Trabalhar e prosperar. Contudo, dizer que está evangelizando enquanto se leva a proposta deste cassino celestial onde se aposta 10 para receber 100 é um disparate. Ordenaram-nos levar a boa nova da salvação, batizar, fazer discípulos e enviar”. Não é a primeira vez que o Pastor Silas Malafaia usa palavras desse tipo para rebater quem o critica, o mesmo já chamou internautas de “safados, bandidos, negos enrolados, invejosos” e outros adjetivos. Fonte: Gospel+
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